Se está na boca do povo, então é o assunto do momento.
Quando falamos sobre tendências, para quem trabalha com comunicação digital ou está imerso no universo das redes sociais, talvez você pense nas hashtags mais usadas, os trending topics do X, os memes mais compartilhados ou as fofocas mais interessantes sobre subcelebridades que 9 em cada 10 pessoas nunca nem ouviram falar até aquele momento.
Antes, é preciso pontuar que o ato de gerar tendências não é uma ação que nasceu com as redes sociais; ao analisarmos a história da humanidade, isso é tão antigo quanto andar para frente. Humanos são seres sociais que adotam padrões em busca sincronizar-se com seus pares para facilitar a socialização.
Podemos notar isso quando analisamos as diversas evoluções linguísticas ao longo dos milênios, o desenvolvimento cultural das populações e o aprimoramento de diversas tecnologias em prol de objetivos coletivos.
Agora, voltando para as redes sociais
Muitas tendências do mundo digital têm o potencial de unir as pessoas, espalhar mensagens de solidariedade e conscientizar sobre temas delicados, como o desafio do balde de gelo.
Não podemos nos esquecer que a criação de tendências é um fenômeno humano comportamental, nem intrinsecamente bom, nem ruim.
O marketing do absurdo é um conceito que chegou para ficar, começou como uma prática recheada de bom humor e irreverência. É uma estratégia de marketing que usa elementos inesperados, inusitados ou até mesmo absurdos (dã) para chamar a atenção do público em variados formatos de mídia.
Muitas marcas têm adotado algumas estratégias ousadas pautadas por isso nos últimos anos. Por exemplo, lembra dos comerciais do desodorante Old Spice com o ator Terry Crews? É praticamente uma obra surrealista antitranspirante com cheirinho de lenha.
Navegando pelas redes sociais, às vezes somos impactados por memes sobre peças com valores astronômicos de estilistas consagrados ou de grandes marcas. Lembra da bolsa de toalha que custava uma bagatela de quase R$ 25.000 da grife Bottega Veneta?
Gerou um burburinho imenso, levando o caso para os trending topics, e angariou mais seguidores para a marca nas suas redes sociais.
No caso da Balenciaga, fica difícil escolher uma peça para usar como exemplo aqui, mas vamos para esse tênis, o modelo Paris Sneaker foi criado pelo diretor criativo Demna Gvasalia. Mesmo parecendo um pouco… gasto, cada par desta edição limitada custava $2.000.
Isso gerou uma enxurrada de memes, muita gente riu e tirou sarro, mas a ação também ajudou a colocar uma marca já muito bem conceituada no mercado de luxo na imaginação popular, aumentou seu alcance nas redes e fortaleceu sua presença enquanto criadora de tendências fashionistas. Ou seja, a obra de Demna Gvasalia foi muito benéfica para a Balenciaga.
Katy Lubin, vice-presidente de comunicações da Lyst (The Lyst Index é o ranking trimestral dos produtos e marcas mais populares da moda) deu sua opinião:
"[Gvasalia é] o grande mestre da moda meme", [ao observar] "enormes picos de visualizações de página para as peças mais experimentais da Balenciaga à medida que viralizam",
Afirmou ela ao Financial Times.
Tendências nas redes: nem tudo é meme orgânico.
Os influenciadores digitais têm se aproveitado do marketing do absurdo no lançamento de tendências que são, no mínimo, pouco ortodoxas, para não dizer muitas vezes "maluquice total". Para influenciadores, a quantidade de seguidores nos seus perfis mensura o sucesso de sua carreira e seus rendimentos financeiros. Quanto mais bombado de fãs o influenciador for, mais convites para #publis receberá.
Falem bem ou falem mal, mas falem de mim.
Às vezes apelar para umas esquisitices traz bons resultados também, afinal, faz com que certos comportamentos sejam compartilhados e mais comentados. Não importa se você ficou absolutamente revoltado com uma dancinha ridícula e reposta ou comenta "olha que pessoa brega/tosca" ou coisa parecida, no fim você só estará ajudando no engajamento, paradoxal né? "Revoltar" também pode ser lucrativo em muitos casos.
Hoje banidas do TikTok, as lives NPC causaram muita estranheza para muita gente. Afinal, quem paga para os outros se humilharem? Eu mesmo tive que refletir muito para entender "como isso dá dinheiro? Pera eu não entendi, a pessoa dança ou imita comer uma espiga de milho e fica repetindo 'obrigado pelo milho' e alguém dá dinheiro para ela? Mas quem e por quê?" – Diálogo que tive pessoalmente com literalmente minha rede inteira no curso de uma semana.
NPC significa "non-playable character" no mundo dos games, é literalmente todo e qualquer personagem num jogo que o jogador não controla. O streamer da live, muitas vezes fantasiado, tem uma postura completamente robótica e reage apenas aos presentes enviados pelo público. Por exemplo, um emoji de sorvete, ou de… milho, e isso valia dinheiro de verdade, viu? A pessoa recebe o presente e faz um gracejo, repetindo a frase ou movimento a cada doação.
Felca é um youtuber e tiktoker brasileiro, e nas suas lives de NPC no TikTok estima-se que ele ganhou cerca de R$ 50.000 da galera que assistiu suas transmissões, mas ele nega o valor estrondoso.
Eu não ganhei nem perto disso, ganhei 10% do que estão dizendo e não teria motivo para mentir sobre esse assunto. O que mais me impressionou não foi nem o dinheiro, mas a quantidade de pessoas on-line na live – Felca
E qual a última tendência do TikTok?
#Bonesmashing é uma hashtag com 261,9 milhões de visualizações, ela não é de agora, mas voltou com tudo recentemente. Alguns usuários dizem que a prática pode trazer melhorias no desenho do rosto, melhor definindo os ossos da face, em especial da mandíbula. Como? Ótima pergunta.
O termo se refere a pegar um objeto e ficar se batendo no rosto, como se fizessem a sua própria cirurgia plástica. Nunca a cultura #DoItYourself foi tão perigosa, para não dizer insana.
"Em um esforço desesperado e depravado para obter beleza física e aceitação dos outros, as pessoas estão quebrando voluntariamente os ossos do próprio rosto, acreditando que os ossos cicatrizarão de uma forma que os tornará mais atraentes fisicamente", disse Kyle Zagrodzky, fundador e CEO da OsteoStrong, ao portal Healthline.
Muitos dos vídeos usando a hashtag na plataforma também são de pessoas preocupadas com essa trend, e têm tentado orientar seus seguidores a não fazerem isso devido aos terríveis problemas que podem ser causados pelas lesões. E, por outro lado, existem tutoriais de como fazê-lo com uma gama de objetos.
Conseguir resultados simétricos? Baixíssimas chances Dr. Etan Sugarmann, cirurgião ortopédico do Lenox Health Greenwich Village, foi categórico em sua resposta para o portal Healthline sobre as chances de sucesso desse tipo de prática. Ele disse que esses procedimentos caseiros têm praticamente 0% de chances de trazer os resultados esperados. Os riscos do Bone Smashing para a saúde Realizar essas autoagressões podem desencadear infecções, lesões nos tecidos moles, fraturas ósseas, cicatrização, sangramento excessivo e danos nos nervos que podem levar à perda permanente de sensibilidade na região. Machucar os ossos da face pode afetar a saúde dos seios nasais, olhos, cérebro, dentes e afetar drasticamente o funcionando desses órgãos, trazendo imensa dor crônica e danos irreversíveis aos ossos.
Parece que vivemos em tempos onde é preciso pedir para que as pessoas não se batam no próprio rosto com um martelo Fora sermos seres sociais, que naturalmente repetimos padrões de nossos pares, mais do que nunca, precisamos incentivar nosso senso crítico individual e avaliar muito bem quais são as tendências que devemos participar. Afinal, enquanto consumidores, temos que preservar nossa segurança, e, enquanto trabalhadores de marcas com presença nas redes sociais, temos uma imensa responsabilidade para com o mundo que influenciamos.
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